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terça-feira, 29 de junho de 2010

Mais luz em sua sombra

Mais luz em sua sombra

Encarar de frente o medo, o ciúme, a inveja e os talentos não desenvolvidos é uma atitude difícil, mas fundamental para quem quer trilhar caminhos mais humanos, baseados no amor e na verdade. Como disse um poeta, "A luz nasce da escuridão", e é nos lugares mais sombrios da alma que estão as chaves para viver em harmonia com todos a seu redor.
Luz e sombra, alegria e tristeza, amor e ódio, perdão e mágoa, saúde e doença, nascimento e morte são fios que se misturam no tecido da vida. A consciência de que não é possível viver só de prazeres não é uma idéia terrível, mas um convite para tirar proveito até mesmo da face mais dura da realidade. Dentro de cada um de nós, sem exceção, existe uma casa com portas bem trancadas, onde habitam nossos piores sentimentos - inveja, desconfiança, traição, ódio, cobiça, medo, amargura, ciúme, crueldade, desejos de vingança, expectativas frustradas e instintos destruidores. Então, temos duas opções: fugir da casa ou colocar luz nesses espaços escuros, em que também ficam guardados muitos tesouros, ou seja, talentos não desenvolvidos, qualidades que ainda não afloraram, sentimentos em potencial.
Não é fácil admitir que esse lado terrível exista: você é um ser humano normal, que carrega em sua personalidade qualidades e defeitos. Segundo o psiquiatra suíço Carl Gustav Jung (1875-1961), todas as faces escuras, ameaçadoras e indesejáveis da personalidade são chamadas de sombra: "Reconhecer e aceitar seu lado sombrio é o primeiro passo para ter equilíbrio emocional e melhorar a qualidade de todas as relações. A sombra faz parte de nosso inconsciente e, se não for encarada, dominará todas as ações, nos rouba a tranqüilidade para aceitar os ciclos da vida, nos tira a beleza, o ânimo e, o pior de tudo, a capacidade de amar, que é justamente o mais iluminado dos sentimentos", explica Isabel Telles, psicóloga do núcleo terapêutico Portão Azul, de São Paulo. Quem age dominado pelas sombras está sempre insatisfeito. Costuma ser um crítico implacável, tem o hábito de culpar os outros por suas próprias faltas e fica muito incomodado com as atitudes alheias sem motivo aparente: "Um bom jeito de identificar a sombra é perceber se você tem reações desproporcionais em determinadas circunstâncias. Por exemplo, uma exagerada irritação com crianças pode indicar que seu instinto maternal está bloqueado. Ou ainda que a inveja por alguém que expressa um talento pode ser o sinal de que você tem a mesma habilidade escondida em sua sombra querendo vir à luz", explica Tereza Kawall, psicóloga junguiana, de São Paulo. Esse jogo de luz e sombra, consciente e inconsciente é repleto de sutilezas: "Ninguém vai ao encontro da sombra porque quer, mas porque está muito incomodado com uma situação ou porque a vida obrigou a enxergar o que não quis ver. Momentos de separação, perda e estresse são propícios para que o pior de nós aflore sem controle. Quem nunca teve um chilique? Esses arroubos de emoção funcionam como um ultimato para que se mude de atitude, se reformulem valores e se aprimorem as relações. Às vezes, isso só acontece com a ajuda do terapeuta", diz Tereza.

Na rotina, o humor e a auto-aceitação ajudam a levar luz às trevas interiores: "Aceitar as próprias falhas exige coragem e humildade. Assim os relacionamentos podem ser mais harmoniosos e deixam de ser baseados em ilusões e expectativas", completa. Aliás, preste atenção nas pessoas que têm o poder de tirar você do sério. Com certeza elas estão convidando a encarar um de seus lados renegados. O próprio Jung costumava dizer que devemos ser gratos aos inimigos, pois a treva deles permite enxergar a nossa. "O meio mais eficaz para vislumbrar a nossa sombra é trabalhando nossas relações. Outras pessoas nos apontarão o que estamos fazendo a elas. Acatando essas objeções de coração, chegaremos a um reconhecimento de nossa sombra", ensina o psicólogo americano John Sanford, autor de Mal, o Lado Sombrio da Realidade (ed. Paulus). Estar de bem com seus monstros internos é uma forma infalível de proteção emocional e psíquica, pois assim você deixa de ser alvo da projeção das sombras de outras pessoas e interrompe círculos viciosos de inveja, vingança, descontrole: "Em vez de jogar a responsabilidade de sua infelicidade no outro - esposa, marido, filhos, colegas de trabalho - ou projetar nele sua ira, sua crítica, sua tristeza, tente assumir que o desconforto pertence a você. Assumir o próprio problema é o início de transformações positivas", diz a psicóloga Tereza. Por exemplo, se você fica nervoso antes de uma reunião e por isso espalha o mau humor por todos os cantos, tente respirar fundo, pense no que está realmente incomodando e tente achar uma válvula de escape que não prejudique os outros: "Sombras todos temos, mas não dá para suportar ser alvo da escuridão de outras pessoas", diz a psicóloga. E nesse caso não vale sair revidando. A solução é pacífica.

Amor e compaixão

"Estar na sombra de outra pessoa e não reagir não é falta de genialidade. É assim que se rompem os ciclos nefastos de vingança", cita o psicanalista americano Robert Johnson no livro Magia Interior (ed. Mercuryo). Ele lembra ainda uma frase de Gandhi (líder político pacifista indiano): "Se você seguir o antigo código de justiça do 'olho por olho e dente por dente', acabará tendo um mundo cego e desdentado". Lidar com a própria escuridão tem uma recompensa e tanto, segundo a psicóloga Isabel Telles: "Você descobre que a grande saída para tudo é o amor, a compaixão e o reconhecimento de que somos todos seres humanos com defeitos e qualidades".

Mais luz em sua rotina

Existem várias atitudes para facilitar o reconhecimento das sombras e impedir que elas apareçam de surpresa, prejudicando suas relações amorosas, profissionais e de amizade. As orientações são da psicóloga paulista Isabel Telles.

Faça um registro de suas sombras. Compre um caderno universitário. Em cada matéria, escreva o nome de um sentimento indesejável: inveja, medo, mágoa, ciúme, cobiça. Antes de deitar, faça uma retrospectiva do dia e anote nos respectivos lugares quando e por que teve contato com essas emoções. E ainda o que pode fazer para superá-las.
Quando alguém causar muita irritação ou repulsa, antes de revidar, respire fundo e perceba o que incomoda no comportamento do outro. Na maioria dos casos, essa pessoa está expressando algo que você não aceita em sua personalidade.
Todos os dias, faça uma auto-avaliação e perceba se conseguiu tomar atitudes que trazem luz para a vida, como perdoar, compartilhar, compreender, colocar-se no lugar do outro antes de julgá-lo, fazer críticas de forma amorosa.
Permita-se não ser impecável, pois todos os seres humanos erram. Brinque com suas falhas e, da próxima vez, tente agir melhor.
Para lidar com os medos, escreva-os - eles se tornam conscientes e você pode dominá-los com mais habilidade.
Não tome todas as reações dos outros como pessoais. Assim você deixa de ser alvo da projeção das sombras alheias e fica mais conectado com sua essência.
Quando sentir ciúme, raiva, inveja, desejo de vingança, em vez atacar o outro, escreva tudo que sente num pedaço de papel e queime. Isso dá alívio e domínio de seus atos.
Agradeça aos seus inimigos, eles podem estar mostrando o que você não enxerga em si mesmo.

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